Somos de barro. Iguais aos mais.
Ó alegria de sabê-lo!
(Correi, felizes lágrimas,
por sobre o seu cabelo!)
Depois de mais aquela confissão,
impuros nos achámos;
nos descobrimos
frutos do mesmo chão.
Pecado, Amor? Pecado fora apenas
não fazer do pecado
a força que nos ligue e nos obrigue
a lutar lado a lado.
O meu orgulho assim é que nos quer.
Há-de ser nosso o pão, ser nossa a água.
Mas vencidas os ganhem, vencedoras,
nossa vergonha e nossa mágoa.
O nosso Amor, que história sem beleza,
se não fora ascensão e queda e teimosia,
conquista... (E novamente queda e novamente
luta, ascensão...) Ó meu Amor, tão fria,
se nascêramos puros, nossa história!
Chora sobre o meu ombro. Confessámos.
E mais certos de nós, mais um do outro,
mais impuros, mais puros, nós ficámos.
quinta-feira, 30 de março de 2017
sexta-feira, 24 de março de 2017
#120 - "uma flor abriu", amadeu liberto fraga
uma flor abriu
e vi:
não foste a primeira
nem serás a última.
lembra, foste a única
que não amei.
perdoa.
e vi:
não foste a primeira
nem serás a última.
lembra, foste a única
que não amei.
perdoa.
quinta-feira, 23 de março de 2017
#119 - CHAMA E FUMO, Manuel Bandeira
Amor -- chama, e, depois, fumaça...
Medita no que vais fazer:
O fumo vem, a chama passa...
Gozo cruel, ventura escassa,
Dono do meu e do teu ser,
Amor -- chama, e, depois, fumaça...
Tanto ele queima! -- e, por desgraça,
Queimado o que melhor houver,
O fumo vem, a chama passa...
Paixão puríssima ou devassa,
Triste ou feliz, pena ou prazer,
Amor -- chama, e, depois, fumaça...
A cada par que a aurora enlaça,
Como é pungente o entardecer!
O fumo vem, a chama passa...
Antes, todo ele é gosto e graça.
Amor, fogueira linda a arder!
Amor -- chama, e, depois, fumaça...
Porquanto, mal se satisfaça,
(Como te poderei dizer?...)
O fumo vem, a chama passa...
A chama queima. O fumo embaça.
Tão triste que é! Mas, tem de ser...
Amor?... -- chama, e, depois, fumaça:
O fumo vem, a chama passa...
Teresópolis, 1911.
Medita no que vais fazer:
O fumo vem, a chama passa...
Gozo cruel, ventura escassa,
Dono do meu e do teu ser,
Amor -- chama, e, depois, fumaça...
Tanto ele queima! -- e, por desgraça,
Queimado o que melhor houver,
O fumo vem, a chama passa...
Paixão puríssima ou devassa,
Triste ou feliz, pena ou prazer,
Amor -- chama, e, depois, fumaça...
A cada par que a aurora enlaça,
Como é pungente o entardecer!
O fumo vem, a chama passa...
Antes, todo ele é gosto e graça.
Amor, fogueira linda a arder!
Amor -- chama, e, depois, fumaça...
Porquanto, mal se satisfaça,
(Como te poderei dizer?...)
O fumo vem, a chama passa...
A chama queima. O fumo embaça.
Tão triste que é! Mas, tem de ser...
Amor?... -- chama, e, depois, fumaça:
O fumo vem, a chama passa...
Teresópolis, 1911.
terça-feira, 21 de março de 2017
#118 - BALADA DO AMOR E DO ESPÍRITO, Fernando de Paços
Que bom era exprimi-la!
Mas só posso sonhá-la...
Como era bom levá-la,
como era bom!... Tranquila!
Como era bom despi-la
ao poder encontrá-la!
-- Já não sorri. Não fala.
Da carne separá-la,
como era bom despi-la!
Acordá-la e despi-la,
do seu corpo despi-la!
mas a alma, que é sua,
que bom era levá-la!
para longe levá-la...
para bebê-la, nua.
-- Já não respira... Estua.
-- Já não responde... Cala.
Mas só posso sonhá-la...
Como era bom levá-la,
como era bom!... Tranquila!
Como era bom despi-la
ao poder encontrá-la!
-- Já não sorri. Não fala.
Da carne separá-la,
como era bom despi-la!
Acordá-la e despi-la,
do seu corpo despi-la!
mas a alma, que é sua,
que bom era levá-la!
para longe levá-la...
para bebê-la, nua.
-- Já não respira... Estua.
-- Já não responde... Cala.
sexta-feira, 17 de março de 2017
#117 - SOLENEMENTE, Hermes Fontes
Juro por tudo quanto é jura... Juro,
por mim... por ti... por nós... por Jesus Cristo
-- que hei-de esquecer-te! Vê-me: estou seguro
contre o teu sólio, a cuja queda assisto.
E, visto que duvidas tanto, visto
que ris do que, solene, te asseguro,
juro mais: pelo Ser em que consisto
por meu Passado, pelo meu Futuro,
Juro pela Mãe-Virgem concebida;
pelas venturas de que vou no encalço!
por minha vida!... pela tua vida...
Juro por tudo que mais amo e exalço!...
...E, depois de uma jura tão comprida,
juro... juro que estou jurando falso!...
por mim... por ti... por nós... por Jesus Cristo
-- que hei-de esquecer-te! Vê-me: estou seguro
contre o teu sólio, a cuja queda assisto.
E, visto que duvidas tanto, visto
que ris do que, solene, te asseguro,
juro mais: pelo Ser em que consisto
por meu Passado, pelo meu Futuro,
Juro pela Mãe-Virgem concebida;
pelas venturas de que vou no encalço!
por minha vida!... pela tua vida...
Juro por tudo que mais amo e exalço!...
...E, depois de uma jura tão comprida,
juro... juro que estou jurando falso!...
quarta-feira, 15 de março de 2017
#116 - CANÇÃO DE OUTONO, António Botto
Ritmo de soluços
Tem esta triste canção
Na aparência toda calma;
É que sobe à minha boca
O que trago na minha alma.
É hoje que tenho penas.
-- As mesmas que sempre tive --
Assim lembrando-as a fundo
Sinto que a vida
Me sustem no meu declive...
Cantando, a gente, amortece
A mágoa maior que seja.
É como beijar a boca
Dalguém que também nos beija.
Coração -- pobre erradio,
Quando acabas de cantar?
-- Acaba, que tenho frio...
Dir-se-ia que vai nevar...
Tem esta triste canção
Na aparência toda calma;
É que sobe à minha boca
O que trago na minha alma.
É hoje que tenho penas.
-- As mesmas que sempre tive --
Assim lembrando-as a fundo
Sinto que a vida
Me sustem no meu declive...
Cantando, a gente, amortece
A mágoa maior que seja.
É como beijar a boca
Dalguém que também nos beija.
Coração -- pobre erradio,
Quando acabas de cantar?
-- Acaba, que tenho frio...
Dir-se-ia que vai nevar...
sexta-feira, 3 de março de 2017
#115 - NA ESQUINA DO VENTO, Cristóvão de Aguiar
minha casa plantaste na esquina do vento
onde as marés afinam suas melodias
desde então te respiro e ganho meu sustento
caiando de palavras os muros dos dias
entre o meu e o teu corpo um intervalo lento
que a baixa-mar escolta bem de penedias
redobra o meu querer-te quanto mais te invento
e só depois me vejo de órbitas vazias.
velha pecha esta minha de mergulhar
nos confins do teu nome para te procurar
e a mim também por rumos que eu já nem sabia.
à minha conta trouxe o mar dentro em mim
vazei-o no meu búzio no dia em que vim
-- ouço o marulhar não lhe cheiro a maresia.
onde as marés afinam suas melodias
desde então te respiro e ganho meu sustento
caiando de palavras os muros dos dias
entre o meu e o teu corpo um intervalo lento
que a baixa-mar escolta bem de penedias
redobra o meu querer-te quanto mais te invento
e só depois me vejo de órbitas vazias.
velha pecha esta minha de mergulhar
nos confins do teu nome para te procurar
e a mim também por rumos que eu já nem sabia.
à minha conta trouxe o mar dentro em mim
vazei-o no meu búzio no dia em que vim
-- ouço o marulhar não lhe cheiro a maresia.
Subscrever:
Mensagens (Atom)